16.12.09

Ni Hau!

Todos os contos aqui postados são de origem ficcional.
O nome Yang, remete ao precursor e Mestre(Si Fu) do estilo do Kung Fu
Wing Chun Chwan.
Sendo estas histórias aqui contadas em sua "homenagem".
O local onde ocorrem as histórias, é a China Antiga, mais precisamente
na Dinastia Sung por volta de 960 à 1279 DC.
Sendo esta uma época de conflitos e rebeliões do povo chinês,
onde houve um grande desenvolvimento
de diversos estilos de Kung Fu,
e os já existentes afloraram devido as necessidades da época.
O intúito deste blog não é agredir qualquer estilo de Kung Fu,
ou crença religiosa, mas sim passar àqueles que praticam
a Arte do Wu Shu, uma certa "noção" da época,
bem como os costumes e tradicionalidades.

Aos que não praticam a arte chinesa,
que fiquem aqui relatadas estas histórias
para o divertimento, entretenimento e talvez um possível conhecimento
sobre o que era e o que é o Kung Fu/Wu Shu.

Do mais, espero que aproveitem e critiquem, afinal,
conhecimento faz parte da sabedoria,
e o caminho da sabedoria é não ter medo de errar.

Saudações marciais à todos!
Felipe de França

15.12.09

Junto à fogueira e a lâmina!

A pouca luz de uma fogueira é o que ilumina a figura solitária em meio a floresta de Quian.

Ele limpa com um pano fino e delicado a longa lâmina de metal em suas mãos, o fogo faz o metal brilhar, o vento fino e suave faz a a roupa da figura solitária balançar, tremular.

Um soar é ouvido, por mais ninguém, além dele mesmo, ele bate com a ponta do indicador esquerdo na lâmina, uma, duas, sete vezes, até que o metal faz o som desejado.
Ele encaixa a ponta oposta do metal em uma concavidade de madeira, trabalhada e ornada com desenhos de três animais, Hóu, Shé e Fon.
Três animais considerados sagrados para o homem sentado próximo a lúgrube chama da lareira.
Sagrados e amaldiçoados ao mesmo tempo.

- Foram eles quem me trouxeram para este local, para perto desta cidade. - Disse o homem de cabelos curtos para sí próprio enquanto terminava de encaixar a lâmina no cabo entalhado.

"O destino não está fora, mas dentro de nós mesmos." - Disse a Serpente.

"Não seja mais um, seja o melhor." - Disse o Macaco.

"A luz não vem ao mundo para zombar das trevas e sim para iluminá-las." - Disse a Phoênix.

Ele se recorda.
Lembra dos animais em sua frente, daqueles que amava terem ido, e de acordar ao lado da espada. Sua única companheira, sua bengala e irmã.

O vento sopra mais forte, desta vez apagando a fina chama, deixando os pequenos gravetos em brasas fracas.
Antes de apagar, a chama ilumina o rosto do jovem uma última vez, bem como a lâmina de sua Miao Dao, antes de desaparecer dentro da bainha.

O escuro toma conta, e o jovem parte, para o local que lhe convier!
Afinal o destino não começa e não termina

Fim do começo.

14.12.09

Um caminho a se trilhar.

Sentado em uma colina, em algum lugar próximo de Quian, a beira da estrada que dava a entrada para a cidade, o jovem observa a mesma à sua frente.
O vento soprava com calmaria, as nuvens brincavam enfadonhas no céu azul e ao fundo da cidade a continuação da floresta de Quian que era cortada por uma lúgubre e fina estrada em meio à ela.

O jovem que recebia o nome de Yang, olhava de longe a cidade, seu movimento e suas cores.
E ficou imerso em seus pensamentos por algum tempo.

O vento era seu único companheiro zumbindo em seu ouvido,refrescando seu rosto, brincando com suas vestes, então, de tráz de uma das muitas árvores, seguindo o caminho da pequena estrada um homem trajando vestes simples de um camponês, com uma faixa vermelha amarrada sobre a cabeça.
Ele puxava uma pequena carroça de frutas, muitas delas vindo das regiões do sul da China.
Ele cantava uma pequena canção, andando alegremente, quando viu o jovem sentado em estado quaze meditativo parou de cantar e disse:

- Olá senhor! Está tudo bem?

Yang que pensava em outro mundo, acordou de seus devaneios e respondeu prontamente.
-Sim. Claro. Estou sim, obrigado por perguntar. - E voltou a admirar a cidade.

O camponês parara de andar, encostou sua carroça e se pôs a olhar a paisagem junto do jovem.
Passaram alguns instantes o camponês se pôs a perguntar novamente.
-O que olha meu jovem?
-Olho ao caminho. - Respondeu Yang.
-Certo. - Ele se calou por segundos antes de voltar a perguntar. - O caminho entre as árvores?
-Não! O caminho que devo percorrer. É muito longo! E não sei se conseguirei.
- Disse Yang.

*Silêncio*

- Mas se pensar que talvez não consiga, não pensará que talvez você consiga. Sabe como é, o sim e o não. - Disse o camponês desta vez olhando em direção a sua carroça de frutas.

Yang que toda a conversa permaneceu olhando a cidade e as nuvens, se virou e olhou para o camponês. Era alguns anos mais velho que ele, talvez alguns verões. Trajava uma roupa cinza escura com uma camisa verde claro e a faixa em sua cabeça.

-Não posso pensar somente no lado positivo, devo pensar nas duas possibilidades, se sim e se não. - Disse Yang como se falasse consigo mesmo.

O camponês que pegara uma maçã dentre suas frutas, a limpava em sua manga, como se a lustrasse, olhou para Yang em seguida para o horizonte e deu uma grande mordida na maçã.
Yang entendendo que fizera uma pergunta a qual nem ele, nem mesmo seu companheiro de instantes teriam a resposta voltou a admirar a paisagem.

Era uma tarde calma, ele sentado à beira da colina e estrada junto do camponês que olhava a cidade e apreciava a maçã. Então, terminou de mastiga-la e disse quebrando o silêncio:

- Se eu como esta maçã, é porque ela me fará bem, do contrário se eu não comê-la ficarei doente e morrerei, agora caso eu coma uma maçã que sei estar podre, eu vou passar mal, comendo ela ou não comendo-a. É a mesma coisa com o caminho, se eu sei que ele é bom ou ruim, cabe a mim e a mais ninguém decidir se ele vai me manter vivo ou não, e caso eu não percorra nenhum caminho, bom, acho que não seria possível não é?. Afinal essa é a lei do TAO.

Yang olhava para a paisagem, porém não pode deixar de ouvir as palavras do camponês, eram palavras simples, vindas de alguém simples, porém eram sábias palavras.
Yang já ouvira de seu mestre a tempos atrás, que a simplicidade da vida é o melhor dos caminhos.

Ele se levantou, sacudindo a poeira de suas roupas, pegou algo enrolado em um pano cinza e se virou para o camponês dizendo

- "Tudo o que você faz ou deixa de fazer na vida, é o resultado direto dos seus pensamentos". Uma pessoa muito querida me disse isto certa vez. E eu lhe digo agora.

- Obrigado. - Disse o camponês fazendo o comprimento tradicional da China.

E Yang foi se retirando, descendo a colina vagarosamente, ele puxara seu coolie para se proteger do sol, quando ouviu um grito do camponês novamente.

-Pegue! - E lhe arremessou uma maçã a qual Yang pegou prontamente. E o camponês continuou dizendo:
- Caminhos são para se trilhar, maças são para se comer! Não se esqueça.

Yang foi seguindo para o caminho dentre as florestas de Quian e para o que ele tinha de trilhar. Olhou a maçã e deu uma mordida nela.
"Realmente, elas são para se comer!"

E se foi por entre as árvores.

13.12.09

Raposas e escolha.

Andando por entre as árvores da floresta de ching, uma província de Quiang, Yang caminha a passos lentos. Sua espada presa à cintura.
Seu coolie amarrado, preso a seu pescoço, deixando assim seu chapéu inerte. Não há sol, as nuvens escondem o rosto dourado do astro celeste. O vento cortante passa pelo rosto de Yang, fazendo seus cabelos dançarem com o elemento da terra.
Seus olhos fechados, rasgados como o de seus conterrâneos trazem uma ferocidade maior em sua expressão, porém, Yang permanece sereno, ao contrário de sua fisionomia.

Seu antigo mestre lhe dizia que os olhos são a janela da alma.
Sua janela estara fechada por muito tempo, e somente após aquele incidente, somente após Ele, as coisas mudaram.

Um ruído chama a atenção de Yang, ele se vira rapidamente, punhos cerrados, posição de combate em xupu. Olha em direção ao desconcertante barulho e vê, uma raposa.Não muito longe. a alguns passos, ela carrega em sua boca uma ave que com toda certeza abatera, para se alimentar ou a sua cria.

Yang relaxa, olha para a raposa. Criatura rara nestas regiões da China, pele magenta no peito, de um vermelho vivo nas costas que se funde a um castanho claro em sua cauda.
Um animal belo, que lhe traz recordações.

"Mestre.
Quero ser o melhor, quero poder derrotar meus inimigos.
Mas sinto que para isto devo dominar todos os estilos de luta, todas as armas que existem.
Somente assim poderei encontrar a maestria. - Dizia um jovem de cabelos revoltosos. Não deveria ter mais que 15 anos. Estavam em uma grande planície. Era outono.
E o mestre olhou seu discípulo, estara com ele a 2 anos, criara uma relação de amizade com o garoto. Como não gostar da impulsividade, de sua ânsia por aprender? De seus olhos, olhos ferozes como os de um tigre.
Então o mestre falou com severidade e suavidade. - Aprender muito, não é aprender bem.
Aprender pouco, não é aprender errado. Aprenda o que lhe couber.

O discípulo, sentado em flor de lótus, bufa de impaciência. Olha seu mestre nos olhos, mas logo desvia o olhar para uma árvore perto.

- Agora vamos! Passe todas os Taolus de Niu. - Disse o mestre.

E o jovem se levantou. Olhou para os olhos do mestre mais uma vez e não conseguiu sustentar o olhar por muito tempo. Mas mesmo assim perguntou. - Quando vou aprender a usar a espada?
Quandou vou usar o Lien Jien Quan?

O mestre se virou de costas e disse. - Quando menos esperar, prepara-te. - E saiu para dentro da floresta, ao lado oposto do discípulo.

No dia seguinte, o jovem estava sentado, esperando por seu mestre na planície. Observando o cenário que fazia mais que parte de sua vida. As árvores que agora estavam secas à leste onde o sol nascia, uma pequena cordilheira de montanhas ao sul. Ele ainda se surpreendia com a quantidade de coisas que aquele lugar velho lhe trazia. E foi se perdendo em pensamentos.
Logo seu mestre voltou. Trazia duas gaiolas, dentro de cada uma delas, raposas.

-Hoje seu treino será outro. Irei soltar estas raposas, você deverá pegá-las. Não irei treinar mais você enquanto não me trouxer estas raposas. Entendeu?

- Mas o que fiz para merecer isto? - Disse o jovem.
- Você merece aprender e entender. - Disse o mestre.

O Jovem correu atrás das raposas como seu mestre lhe havia pedido. Por mais que tentasse, não conseguia. Pensou que aquilo era um teste, seu mestre sempre lhe dava testes. Mas parece que em sua ânsia de querer saber mais, acabou exagerando.

Em um determinado momento, conseguiu agarra uma delas, e trouxe a seu mestre.
- Pronto! Me treine.

-Não. Quero as duas. - Disse o mestre impassível.
E o jovem ia colocar a raposa na gaiola quando o mestre disse. - Não. Quero as duas. Em suas mãos. E vivas.

O jovem serrilhou os dentes. Mas não conseguiu segurar a raposa e correr atrás da outra.
Tentou por horas, mas sempre que chegava próxima das duas, elas seguiam para caminhos opostos e ele não sabia para onde seguir.
Exausto, o jovem sentou na frente de seu mestre uniu as mãos em sinal de perdão e disse.
- Mestre, me ensine. Não sei como pegar as raposas. Me treine. Eu lhe imploro.

O mestre olhou para o jovem. Desta vez seu olhar era de compaixão.
Se aproximou do jovem discípulo e disse.

- Meu filho. Seria impossível você segurar as duas raposas. Elas não iriam parar quietas.
Você não teria como segura-las.

- Mas então, o que devo fazer? - Disse o jovem desta vez olhando para o mestre sem desviar o olhar.

- Aprenda com seu erro de hoje.
Ontem você me pediu para lhe ensinar todas as técnicas. Ser o melhor em todas as artes do Wushu. O caminho a se trilhar no Wushu, são como as raposas.
Se tentar seguir uma arte você pode até segura-la, mas se tentar outra ela irá lhe enganar, lhe ludibriar e logo, escapar.
Os estilos de Wushu são como as raposas, você deve segurar firme uma, pois não conseguirá pegar a outra. E se tiver uma bem forte em seu peito. Não precisará de duas."

Yang volta de sua lembrança. Seus olhos ferozes se mantém para a raposa. Ela se vira e sai para floresta adentro.

Ele olha para os céus. Um fino facho de luz passa por uma nuvem. O inverno está no fim.

Wushu. Tao.
Todos tem sua relação. Ele escolheu seu caminho.
E sua raposa.

12.12.09

O soldado, o cavalo e o andarilho.

Andando pelas florestas de Quian.
Yang prossegue sua viagem para o sul, onde deveria encontrar o que procurava.

Sua túnica e sua calça preta entravam em contraste com a verde vegetação da floresta. As vestes de um andarilho sempre eram surradas, muitas vezes mal cuidadas. Mas não as roupas de Yang.
Eram tratadas com um zelo a qual somente ele entenderia o motivo.

O céu não podia ser visto, devido a densa floresta que o cercava. Pequenos fachos de luz transpassavam pelas copas das árvores.

Ele olhou mais em frente e conseguiu distinguir o barulho de um cavalo. Forçou sua vista e viu que nele havia um homem. Trajando uma armadura de couro, cujo brasão no peito era o de um círculo amarelo, representando as cores da cidade de Hoang Ho. O homem acima do cavalo aparentava ser muito jovem para ser de alta patente do exército, então provavelmente seria um mensageiro.

O soldado e o cavalo se aproximavam, e notaram Yang, o cavalo ficou feliz de ver outra criatura que não seu montador.
Já o soldado nem tanto, este segurou o cabo de sua espada curta e se impôs melhor sobre sua montaria.


Yang parou na distância de alguns metros do soldado, ainda segurando sua trouxa de panos na mão esquerda, a qual escondia sua Miao Dao. Afinal não é prudente andar com uma espada tão valiosa em uma terra sem leis como Quian.

O soldado fez com o cavalo para que este fosse à frente do andarilho que fizera questão de parar a alguns metros dele.

Olhou por cima de Yang, ainda que não quisesse seria difícil estando em cima do cavalo.
Fez a melhor cara de poucos amigos que conseguiu e disse sério, mas que para Yang pareceu cômico: - Sou Lin Yue Nam, Arauto chefe da cidade de Hoang Ho. Quem é você mendigo?

Yang fez questão de ignorar o "mendigo", sabia que os guardas do exército de Hoang Ho eram cheios de si mesmos, e por isso estavam sempre vazios.
Olhou para o soldado de nome Lin e disse levantando seu chapéu cônico:
- Yang! Sou da cidade de Chin.

O Soldado olhou mais uma vez, porém o cavalo não parava de se mexer irrequieto.
Pensou em perguntar onde Yang iria, o que fazia andando sozinho, mas era tão comum encontrar pessoas andando sozinhas nestas épocas de guerra .

-Vem do sul mestre Lin Yue? Soube que os piratas estão invadindo. - Disse dando um meio sorriso.

- Sim, fui enviado para achar o Sifu Lon Tien, ex-monge Shaolin, seu irmão foi sequestrado pelos piratas.

O soldado percebendo que falara demais, virou o rosto para frente e ficou irrequieto junto do cavalo, fazendo assim com que a junção da montaria e cavaleiro fosse algo de dar dó. Ou de risos.

- Certo senhor Lin Yue, siga sua viagem, mas saiba que Sifu Lon Tien morreu fazem algumas semanas. - Disse Yang se virando e começado a andar.

O soldado boquiaberto, olhou para Yang e perguntou:
- Como sabe disso? É mentira não é? Você é só um mendigo, não pode saber dessas coisas. - Demonstrando uma preocupação visível, virou o cavalo para Yang, apesar do cavalo estar relutante cumpriu a ordem. Yang continuava caminhando a passos lentos.

- Me responda seu infame! Mentiroso. Vamos me diga! - Gritou o soldado.

Yang percebeu a pequena alteração na respiração do arauto, e ouviu quando o mesmo fez o cavalo entrar em carga em sua direção.
Mas não reagiu.
Ajeitou o coolie em sua cabeça tranquilamente, e desta vez ouviu o desembainhar da espada do soldado.
Ele reagiu.

O cavalo vinha no que poderia se imaginar em um trote rápido, pois montaria e cavaleiro não aceitavam muito bem um ao outro, e o arauto chefe estava mais para mensageiro de quitanda.
O soldado acima do cavalo elevou a espada acima de sua cabeça, e fez o cavalo seguir na direção exata de Yang, que não moveu um músculo.

Ainda de costas para a dupla decincronisada, ouviu o galope do cavalo ficar mais forte, e ouviu um pequeno estalo, quando o cavalo tropeçou em algo que parecia ser um tronco fincado no chão.
O cavalo se salvou e conseguiu se manter em pé, mas o Arauto chefe, foi para frente com o impulso e alçou voo por sobre Yang, que se manteve impassível e imóvel.

Após toda a cena de desgraça para o soldado e de comédia para Yang, o arauto fica em pé, segurando o que deveria ser sua espada, mas era apenas um pedaço de madeira.

- Como sabe que Sifu Lon Tien morreu? Me diga? - Disse Lien Yue Nam,
arauto de Hoang Ho
- Por que EU o matei! - Disse Yang, andarilho chinês.

E o cavalo observou tudo com grande interesse, mas na verdade estava apenas se divertindo!